A conquista de Lisboa, comandada pelo rei português Afonso Henriques em 1147, está inserida no processo de Reconquista Ibérica e no movimento mais amplo de expansão da fé cristã, que inclui ainda as Cruzadas ao oriente e a cristianização das regiões escandinava e eslava.
Antes da invasão árabe, a Península Ibérica era habitada por povos germânicos convertidos ao Cristianismo durante a Alta Idade Média. Contudo, após a morte de Maomé, os muçulmanos expandiram seus domínios pelo norte da África, até que, em 711, o general do Império Islâmico, Tarik ibn-Zyiad atravessou o estreito de Gibraltar (nome dado em sua homenagem) e adentra a península, derrotando os cristãos e expulsando os visigodos para uma região montanhosa no norte da península (Astúrias), de onde teve início a ofensiva cristã.
Por conseguinte, em 718, Pelágio, líder dos Visigodos, reúne um grupo de montanheses que estavam refugiados nas montanhas, dando inicio a reconquista dos territórios perdidos. Com efeito, ele obtém uma grande vitória em 722, na Batalha de Covadonga e, no ano de 740, as terras localizadas ao norte do rio Douro já eram cristãs novamente. Sem espanto, as populações das regiões reconquistadas passavam aos exércitos cristãos, engrossando suas fileiras.
Contudo, foi a partir do século XI que o processo de reconquista da península acelerou-se, uma vez que a reconquista daquele território passou a ser considerada uma missão sagrada. Assim, com o apoio do movimento das Cruzadas, os reinos ibéricos retomaram cerca de metade dos territórios muçulmanos em pouco tempo, conquistando o Califado de Córdoba, ainda em 1031.
O Portugal do período, bem como toda a Península Ibérica, estava em constante conflito pela manutenção e ampliação de suas fronteiras, seja no campo de batalha ou no diplomático. Os acordos se sucediam conforme a conjuntura se mostrava mais ou menos favoráveis a determinados intentos. Por vezes soberanos cristãos e muçulmanos se juntavam contra outro desta ou daquela invocação. O avanço em direção ao Tejo por parte dos portugueses ocorreu num momento de fragilidade dos muçulmanos, que passavam por uma crise, da qual resultaria a troca da dinastia mais importante na porção da península dominada pelos muçulmanos, passando o poder dos Almorávidas para os Almóadas. Afonso Henriques, portanto, viu na fragilidade do inimigo e aproximação de potenciais aliados a janela de oportunidade perfeita para tentar conquistar Lisboa, a cidade mais importante do Ocidente de Al-Andaluz. A Reconquista e a Cruzada estavam inseridas no contexto de expansão da Cristandade. Ambos os movimentos se direcionavam contra os chamados infiéis.
Portugal, no século XII, lutava pra manter sua autonomia. Oficialmente era Condado do Reino de Leão, mas buscava se firmar enquanto Reino independente. Uma das formas de justificar essa autonomia era combater (e vencer) os muçulmanos que estavam no sul da Península Ibérica.
Imagem que retrata o Cerco de Lisboa e sua Reconquista em 1147.
A tomada de Lisboa, em 1147, insere-se num contexto circunstanciado por acontecimentos internos e externos que merecem ser enunciados. A década de 40 do século XII foi proveitosa no que diz respeito à Reconquista Portuguesa. Em 1142, D. Afonso Henriques reocupa Leiria e, em 15 de Março de 1147, apodera-se de Santarém. Tratam-se de dois sucessos militares com consequências estratégicas de extrema importância. Por um lado, Leiria seguraria o flanco sul do condado, enquanto que por outro, Santarém se tornaria o ponto de apoio decisivo para uma possível campanha destinada a Lisboa.
Ao mesmo tempo as ocorrências exteriores que preocupavam a Cristandade favoreceram, em geral, uma expedição a Lisboa. As notícias provenientes do Oriente não eram nada animadoras. Em 1144, a cidade de Edessa cairia em mãos muçulmanas. Como se não bastasse, o reino de Jerusalém era pressionado por divisões internas, constituindo outro fato alarmante. A reação necessária a esta difícil conjuntura que recaía sobre os estados cruzados, será promovida pela Santa Sé. O Papa Eugênio III pregara a Segunda Cruzada, em 1146. Também São Bernardo de Claraval decide peregrinar pela França e pelo Império Germânico com o intuito de reunir os apoios requeridos para a referida cruzada. Assim sendo, em 1147, Luís VII, rei da França, e Conrado III, imperador do Sacro Império Romano-Germânico, tomam a cruz. Estava assim lançada uma empresa, bastante grandiosa, destinada ao Oriente. É verdade que a Segunda Cruzada não obterá qualquer êxito militar relevante no Oriente. Todavia, num certo dia, um número nada subestimável de cruzados estrangeiros que rumavam ao Levante, aportariam em território português, prestando um auxílio decisivo que viabilizará a conquista de Lisboa por D. Afonso Henriques.
A 19 de maio zarparam os primeiros contingentes de Cruzados de Dartmouth, Inglaterra, constituídos por flamengos, normandos, ingleses, escoceses e alguns cruzados germanos. A armada chegou à cidade do Porto a 16 de junho, sendo convencidos pelo bispo do Porto, Pedro II Pitões, a tomarem parte nessa operação militar. Após a conquista de Santarém (1147), sabendo da disponibilidade dos Cruzados em ajudar, as forças de D. Afonso Henriques prosseguiram para o Sul, sobre Lisboa.
No mapa acima podemos ver o movimento das cruzadas durante a Idade Média, entre elas, a Reconquista de Lisboa (1147) durante a 2ª Cruzada.
Lisboa era um ponto estratégico importante. Como é sabido, Dom Afonso Henriques não era rei de um reino em paz, era um reino em expansão para sul. Nesse avanço para sul e de tomada de cidades e de pontos estratégicos aos reinos muçulmanos havia uma linha importante que era a linha do Tejo.
Depois de 1147 Lisboa não deixou de ser portuguesa e a cidade se tornou o ponto de onde partiriam os novos ataques aos muçulmanos do sul. Alguns dos cruzados que auxiliaram na tomada da cidade permaneceram em Portugal e receberam benefícios do rei português.
Ora, pelas Cruzadas, ordens religiosas e militares como a dos Templários, passaram a combater os muçulmanos, bem como todos aqueles cristãos que buscavam indulgências e perdão divino. Consequentemente, vários reinos cristãos surgiram das derrotas mouras, como o Condado Portucalense, o Reino de Aragão, o Reino de Castela, o Reino de Navarra e o Reino de Leão. O mais precoce foi Portugal, o qual logrou sua reconquista em 1147, com a reconquista da cidade de Lisboa e em 1187, com a formação do Condado Portucalense no noroeste da Península. A conquista da cidade de Faro abriu caminho para o repovoamento da região Sul e consolidou a dinastia de Borgonha, a qual governou o primeiro Estado Nacional europeu até 1383.
Enquanto isso a Cruzada continuou, houveram várias expedições e desvios dos planos iniciais. Os cruzados conquistaram Constantinopla, a perderam, bem como todas as terras que conseguiram na região da Terra Santa. Na Península Ibérica, por outro lado, o avanço sobre terras islâmicas continuou (de forma intermitente) até a conquista de Granada em 1492.
Referências Bibliográficas:
PAIVA, M. – “Cruzada e Reconquista: as duas faces da conquista de Lisboa em 1147”. Medievalista. Nº5, (Dezembro de 2008). Disponível em https://medievalista.fcsh.unl.pt/MEDIEVALISTA5/medievalista-paiva.htm. Acesso em: 12/09/2020.
NASCIMENTO, A. (ed., trad. e notas). A Conquista de Lisboa aos Mouros – Relato de um Cruzado. Lisboa: Vega, 2001.
MEDEIROS DE HENRIQUES, P. N. Os Portugueses e as Cruzadas (Séculos XII-XIV). Dissertação de Mestrado, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2011. Disponível em:https://repositorioaberto.up.pt/bitstream/10216/57428/2/TESEMESPEDROHENRIQUES000148584.pdf. Acesso em: 12/09/2020.
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Por Sérgio Amaral, Historiador e Host do Podcast História e Sociedade.
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